domingo, 26 de julho de 2009

iniciação

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- INICIAÇÂO
Falar do que foi para nós, Aprendizes, a cerimónia de iniciaçăo, năo é tarefa fácil. As provas a que fomos submetidos tęm, para cada um de nós, uma interpretaçăo pessoal, que deve manifestar-se sob a forma de ensinamentos e que, sendo simbólica, é sempre passível das mais diversas interpretaçőes.

A iniciaçăo, para além do aspecto secundário de servir para os maçons de cada oficina analisarem as futuras qualidades maçónicas e, por isso mesmo humanas, do candidato tem, como objectivo principal, simbolizar a dicotomia que naquela cerimónia gradualmente se processa, entre as pesadas trevas do mundo profano e a leveza da Verdade ou seja da Luz. Tendo sido iniciado e, portanto, nascido para uma nova vida, o Aprendiz tem agora a possibilidade de percorrer a longa estrada da Vida, năo sozinho, debatendo-se e tropeçando a todo o momento - como até entăo fizera - mas amparado pelos seus irmăos mais velhos, que o ensinam e conduzem através dos obstáculos, numa atmosfera verdadeiramente fraternal. Compreendendo a iniciaçăo, o Aprendiz tomou conhecimento com o verdadeiro segredo da Maçonaria. Este segredo, incompreensível para a maioria dos profanos, e que muitas vezes se torna o principal motivo do combate antimaçónico, năo é mais que o próprio segredo da Vida.

Dentro da Maçonaria, o Aprendiz passa a trabalhar efectivamente para o seu progresso e o dos seus irmăos e, muito em particular, encontra-se apto para congregar esforços com todos aqueles que, ŕ sua semelhança, buscam a gnose - e, por isso, a perfeiçăo - e juntos contribuírem para a construçăo de um Tempo onde, acima de tudo, impere a divisa da Liberdade, Igualdade e Fraternidade e onde os homens se guiem pelo código da Justiça, Verdade, Honra e Progresso.

Quanto ŕ cerimónia em si e, em particular, no meu caso, saliente-se que na semana anterior ŕ iniciaçăo tinha ido ver a versăo cinematográfica d'A Flauta Mágica de Mozart, feita pelo sueco Ingmar Bergman. Evidentemente que depois de ter visto as provas de iniciaçăo da personagem principal, Tamino, estava ŕ espera de que as minhas se processassem em moldes semelhantes. Confesso que estava um pouco assustado com a dificuldade das provas a que ia ser submetido e das ciladas que me seriam feitas para testar as minhas eventuais virtudes. Acima de tudo năo queria proceder como um "Papageno". Nesse aspecto, as provas năo foram tăo exigentes quanto eu esperava. Mas também năo se pense que foram fáceis: de tudo, o mais difícil de superar foram os questionários: a importância das perguntas feitas pelos irmăos arguentes é tal que estas năo podem nem alguma vez poderăo ser respondidas efeicazmente no simples intervalo entre duas viagens e, sobretudo, debaixo do nervosismo do candidato. Porém, o questionário é, talvez, dos pontos mais importantes das provas de iniciaçăo.

Para terminar, queria salientar a beleza do ritual em si, que representa, na perfeiçăo, o despertar para uma nova vida que todos nós desejamos seja mais pura, e que permitiu sentir o calor humano dos irmăos reunidos nesta R.·. L.·..

II - CONSIDERAÇŐES ACERCA DE UM SÍMBOLO: O COMPASSO
O compasso, na emblemática maçónica, representa, como tăo bem escreveu o nosso Resp.·. Ir.·. e Sap.·. Gr.·. Mest.·. Adj.·., Alexandre Herculano, as "possibilidades do pensamento nas diversas formas de raciocínio e, também, da merida, do relativo (círculo) dependente do ponto inicial (absoluto). [...] Quanto mais aberto for o ângulo (até ao limite de 180ş), tanto maior será o círculo, o que simbolicamente indica a extensăo possível do pensamento a partir de um espírito cada vez mais forte".

Assim, o ângulo do compasso define o raio de acçăo intelectual do homem, que é o seu centro. Quanto maior for a perfeiçăo atingida por cada maçon tanto maior será a circunferęncia e o círculo por esta delimitado e, por conseguinte, tanto maior será o seu poder de construlçăo mental na grande obra arquitectónica que é o Universo.

Neste sentido e ainda simbolizando a predominância da acçăo intelectual do obreiro sobre a matéria, o compasso surge, relacionado com o esquadro, nos tręs primeiros graus da Maçonaria Simbólica.

  • 1ş grau (Aprendiz): esquadro sobreposto ao compasso. Significa que o Aprendiz ainda năo adquiriu a plena conscięncia de si e de todas as suas possibilidades intelectuais, năo estando ainda apto para uma construçăo inventiva; predomínio da acçăo material;
  • 2ş grau (Companheiro): compasso entrelaçado com o esquadro. Representa a acçăo intelectual a par da acçăo material. Aqui, o obreiro já se encontra habilitado para tentar, embora sob a vigilância do Mestre, construir por si;
  • 3ş grau (Mestre): compasso sobreposto ao esquadro. Neste grau, teoricamente, o maçon atingiu a plenitude do conhecimento maçónico, havendo um predomínio da acçăo intelectual sobre a acçăo material.

III - NOME SIMBÓLICO: JOSÉ ANASTÁCIO DA CUNHA
José Anastácio da Cunha (Lisboa, 11.5.1744 - Lisboa, 1.1.1787) foi um brilhante matemático e poeta da segunda metade do século XVIII.

Nascido em Lisboa, desde logo a sua educaçăo seguiu a linha do humanismo e da liberdade possível na época. Sendo ainda nestre século o ensino totalmente dominado pela Igreja, Anastácio da Cunha ingressou, ao que se julga, aos dezasseis anos, na Congregaçăo do Oratório de Lisboa, onde adquiriu vastos conhecimentos. Os Oratorianos possuíam, contudo, uma particularidade deveras importante: opondo-se ao paradigma educacional da época (escolástica, preconizada pelos jesuítas), propunham e utilizavam um novo sistema de ensino, humanista, aberto, baseado num experimentalismo humano, que fez com que fossem os precursores em Portugal dum ensino moderno. Foi junto destes padres, tăo liberais e abertos para a época e para religiosos do século XVIII, que José Anastácio da Cunha adquiriu os estudos necessários que lhe permititam assentar praça no Regimento de Artilharia do Porto, sediado em Valença do Minho, para o qual foi nomeado como 1ş tenente da Companhia de Bombeiros por Decreto do Conselho de Guerra de 25 de Junho de 1764. O quadro de oficiais deste Regimento era essencialmente constituído por estrangeiros, contratados pelo maçon conde de Schaumburg Lippe, quando este fora encarregue pelo marquęs de Pombal de organizar o exército portuguęs. Foi em Valença do Minho que José Anastácio da Cunha teve os primeiros contactos com a Maçonaria: o comandante do Regimento era o escocęs James Ferrier, provavelmente maçon, assim como maçon era Miguel Kinselac, que foi condenado pela Inquisiçăo (1778) como pedreiro-livre. Tendo sido obrigado a abandonar Portugal, James Ferrier foi o autor, sob o pseudónimo de Arthur William Costigan, duns importantes Sketches of Society and Manners in Portugal (2 vols., London, T. Vernor, 1788), onde criticou causticamente a situaçăo portuguesa e onde advogou os princípios racionalistas e maçónicos. Ferrier exerceu grande influęncia sobre os seus subordinados. também no quartel de Valença do Minho os oficiais liam e recitavam escritores como Pope, voltaire e Holbach, cujas obras estavam classificadas pela Santa Sé como heréticas e subversivas.

Ao estudar no Regimento de Artilharia do Porto, e constatando o obsoleto ensino que se fazia da matemática através das obras de belidoro e da mecânica pelos trabalhos de Dulac, José Anastácio da Cunha elaborou (1769) uma Carta Physico-Mathematica sobre a Theoria da Polvora em Geral, e a Determinaçăo do Melhor Comprimento das Peças em Particular (editada no Porto, em 1838, por José Vitorino Damásio e Diogo Kopke), em que sobre estes assuntos apresentava ideias novas. Esta sua obra terá sido a responsável directa pela sua nomeaçăo (1773), por parte do marquęs de Pombal, para reger a cadeira de Geometria na recentemente reformulada Faculdade de Matemática da Universidade de Coimbra. POrém, apenas cinco anos após ser empossado como lente naquela Faculdade, foi denunciado ao Santo Ofício como herege. A denúncia era essencialmente baseada nas "imoralidades" por ele cometidas, juntamente com os seus colegas, no Regimento em Valença, e no ensino de teorias de autores proibidos pela Igreja. Pelo período que passou em Valença do Minho, acusaram-no de "[...] se persuadir dos erros do deísmo, tolerantismo e indiferentismo, tendo para si, e crendo que se salvaria na observância da lei natural (...)" e ainda por ter por "[...] injustas e tiranas as leis com que a Igreja obrigava os fiéis a captar os seus entendimentos [...] persuadindo-se igualmente que qualquer pessoa se salvaria em toda e qualquer religiăo que seguisse, e fielmente observasse, capacitado que obrava bem, ainda que errasse, năo sendo por malícia, mas por falta de conhecimentos". Quanto ao ensinamento de doutrinas hereges, foi acusado de ensinar pelo Sistema da Natureza de Holbach, tendo-se até provado que emprestara um exemplar a D. rodrigo de Sousa Coutinho (conde de Linhares).

Assim, José Anastácio da Cunha foi preso, condenado e internado na casa da Nossa Senhora das Necessidades da Congregaçăo do Oratório de Lisboa (local por ele escolhido para cumprir as suas penas); e afastado para sempre do ensino universitário.

De toda a sua obra, dedicada ŕ matemática, física e filosofia, o mais importante trabalho foi, sem dúvida, os Princípios Mathematicos [...] (Lisboa, 1790), que o eminente geómetra inglęs Playfair considerou ser: "A primeira obra científica de Portugal, que faria honra aos países mais adiantados em conhecimentos filosóficos."

Foi também José Anastácio da Cunha um poeta. Influenciado pelas escolas francesa e inglesa, alguns autores consideram-no percursor do Romantismo em Portugal. Foi em 1839 que a sua obra poética, pela primeira vez reunida em volume, pela măo de Inocęncio Francisco da Silva, saiu do prelo, com o título de Composiçőes Poéticas do Doutor José Anastácio da Cunha, [...] (Lisboa, 1839). A poesia de José Anastácio da Cunha foi definida pelo próprio Almeida Garrett ao dizer:

    "De José Anastácio da Cunha, que das matemáticas puras nos deu o melhor curso que há em toda a Europa, desse infeliz engenho (que talento houve já feliz em Portugal) a quem năo impediam as rectas de Euclides, nem as curvas de Arquimedes, de cultivar as musas; de tăo ilustre nome, que direi eu, senăo o muito que me pesa da raridade das suas poesias? Todas tăo filosóficas, ternas e algumas repassadas de uma tăo meiga sensibilidade, que deixam na alma um como eco de harmonia interior, que năo vem do metro dos seus versos, mas das ideias dos pensamentos."

Chegamos finalmente ŕ questăo de ter ou năo José Anastácio da Cunha sido maçon. Năo há qualquer documento conhecido que o indique objectivamente, até porque os documentos originais referentes ŕ Maçonaria Setecentista perderam-se quase todos - se alguma vez os houve - nas numerosas perseguiçőes que lhe foram movidas. Tem-se notícia, contudo, da existęncia, em meados e finais do século XVIII, de um oficina maçónica a funcionar em Valença do Minho, para a qual năo existe qualquer documentaçăo conhecida. Tudo isto, aliado ŕs amizades e conhecimentos de José Anastácio da Cunha, aponta para que tenha sido iniciado em data e local desconhecido, talvez no regimento aquartelado naquela localidade minhota, cujo comandante e outros oficiais, de origem inglesa, eram provavelmente maçons, como confirma Raul Rego ao afirmar: "José Anastácio da Cunha, futuro lente de Coimbra, terá sido iniciado em Valença do Minho por oficiais ingleses."

Existe no entanto um documento que prova que José Anastácio da Cunha era maçon e que fora iniciado em Valença, ou - hipótese mais remota - em Almeida: trata-se de uma carta que lhe escreveu a sua amante Margarida e que se encontra reproduzida por António Baiăo nos seus Episódios Dramáticos da Inquisiçăo Portuguesa. Esta carta possui a particularidade de apresentar aquilo a que o Baiăo chama de "indecifráveis sinais", e que năo săo mais do que escrita maçónica. A mulher que escreveu esta carta, provavelmente ensinada por José Anastácio da Cunha, utiliza o alfabeto maçónico para ocultar palavras como "santo ofício", "religiăo", "temente a deus" e "vivi", embora com alguns erros ortográficos, motivados certamente pela inexperięncia no uso deste alfabeto e também pela sua pouca cultura, demonstrada ao longo de toda a missiva.

Este documento, há muito publicado nos meios historiográficos, escapara sempre ŕ observaçăo atenta dos maçons, năo compreendendo, portanto, os profanos o significado da simbologia nele empregada, embora os sinais tenham sido recentemente decifrados. O seu valor para a história da Maçonaria portuguesa é duplamente importante: por um lado, por provar que José Anastácio da Cunha foi maçon, năo apenas em espírito e em ideologia, mas tendo efectivamente recebido a Luz; por outro, na medida em que é o mais antigo documento conhecido para Portugal a apresentar escrita com o alfabeto maçónico. Sobre este assunto encontram-se investigaçőes em curso de que, numa altura mais próxima, informarei esta R.·. L.·..

Por tudo o que aqui foi dito e todo o mais que ficou por dizer, José Anastácio da Cunha contribuiu decisivamente para o progesso intelectual do País e, por conseguinte, da humanidade em geral. É pois um exemplo que é necessário năo esquecermos, tanto pelo seu valor intrínseco, como pelas perseguiçőes que lhe foram movidas - a ele e a tantos outros homens de real valor da nossa história - por parte de forças ancestralmente cultoras da ignorância e do antiprogresso.





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